O presidente desaparecido


Outro dia ouvi, numa fila de banco, um sujeito insinuar a outro que o país tem presidente.

Com a maior educação possível, entrei na conversa:

- Desculpe a intromissão, mas acho que o senhor está enganado. Eu me considero uma pessoa bem informada, e pelo que sei, não temos presidente há um bom tempo.


Esse meu vizinho de fila fez uma cara de surpresa:

- Como assim? - perguntou - Eu também vejo as notícias na televisão. O presidente é um tal de Temer, falam dele toda hora...

Tentei esclarecê-lo:

- É, também já ouvi falar desse tipo. Mas faz tempo que ele desapareceu. Não é mais visto nem aqui, nem fora. Me lembro que era casado com uma moça muito bonita, bem mais jovem que ele, mas ela também sumiu, ninguém mais sabe para onde foram ou o que aconteceu com eles.

A fila andou um pouco e demos dois passos à frente. Meu companheiro de espera ainda insistiu:

- Mas vi, semana passada mesmo, na televisão, esse Temer embarcar num avião para uma viagem para um encontro, sei lá, de um tal de "G" qualquer coisa...

 Nem deixei que completasse a frase:

- Eu também vi isso, mas tenho certeza de que aquilo era um truque, ou uma imagem velha, algo feito feito para nos enganar. O senhor teve alguma notícia de que esse hipotético presidente chegou em algum lugar, ou que se reuniu com alguém nesse encontro, que tenha falado alguma coisa, ou mesmo que tenha voltado para cá? 

Minha pergunta ficou sem resposta.

A fila andou mais um pouco.

Continuei com minha peroração:

- A verdade, meu senhor, é essa: o único presidente que temos hoje é o Bira, do Fundo de Quintal. Ouço falar de um tal de Getúlio, que dizem ter feito um monte de coisas erradas e várias outras certas; me lembro vagamente de um de apelido Jango, que saiu corrido por causa dos militares; me recordo mais fortemente de um tipo esnobe e pernóstico, que quebrou o país várias vezes, cujo nome foi abreviado para FHC, e é claro, desse ex-metalúrgico barbudo que querem prender de todo o jeito porque têm medo de que ele volte à presidência e, novamente, faça alguma coisa para os mais pobres. 

Demos mais dois passos à frente. 

Foi aí que meu interlocutor disse algo que realmente me tirou do sério e pôs fim à nossa interessante conversa:

- É, esse nosso Brasil realmente não tem jeito - falou.

Deu tempo para responder, quase aos gritos, antes que o caixa me chamasse:

- Brasil? Que Brasil? O Brasil também desapareceu, sumiu, ninguém sabe onde foi parar! (Carlos Motta) 

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