O Rio de Janeiro visto do mar


O Rio de Janeiro é uma das cidades mais fotografadas do mundo. O fotógrafo Odir Almeida, porém, se dedica a clicá-la a partir de uma perspectiva completamente diferente: de dentro do mar para fora. O misto de artista e nadador reunirá parte da sua obra, com imagens marítimas exclusivas e impactantes na exposição “Celacanto”, que fica em cartaz de 6 de julho a 5 de agosto no Centro Cultural Oi Futuro, no Flamengo. O nome da mostra é inspirado nos celacantos, peixes abissais pré-históricos cujas barbatanas - acreditavam-se - podiam causar maremotos, como sugerem as imagens produzidas pelo artista.

A mostra convida o público a ter outro olhar sobre a cidade, ao retratar esse Rio que surge no horizonte, capturado da linha d’água para a terra. Sob o ponto de vista de um ser aquático, ondas se agigantam sobre a cidade, edifícios parecem peças de brinquedo e montanhas são parcialmente cobertas pelo movimento constante - e nunca o mesmo - das ondas do mar. O público poderá mergulhar nas 21 fotografias inéditas em grande formato, em cor e preto e branco, que estarão em exposição, e experimentar o processo de captação de Odir Almeida, por meio de vídeos e 150 imagens projetadas em looping num espaço imersivo de quatro paredes chamado “Mar em Moto”.


Em monitores, serão mostrados depoimentos sobre o trabalho do artista nadador, como o do poeta Guilherme Zarvos, do psicanalista Paulo Próspero, do cineasta Silvio Tendler e da curadora Maria Arlete Gonçalves. Serão exibidos, ainda, trechos do episódio “Celacanto Provoca Maremoto” da antológica série de TV National Kid, dos anos 60, de onde saiu a frase que inspirou o o primeiro grafite que se espalhou pelos muros e tapumes cariocas nos anos 70, do jornalista Carlos Alberto Teixeira, e que até hoje desperta curiosidade sobre seu significado.
 
Olhos de peixe


“O Odir deve ter meio Rio de Janeiro fotografado e sempre me interessei pelo seu jeito todo próprio de captar imagens de gente do meio da arte contemporânea. Um dia, fomos parar dentro d’água porque ele queria produzir o inusitado: fazer fotos minhas no mar”, conta o cineasta Silvio Tendler. Ao vê-lo  entrar na água e  equilibrar com destreza corpo e câmera, e “largar o dedo no disparador”, que o mistério foi descoberto: “Ele é o boto!”, revela. “É esse olhar, de mamífero fotográfico,  dentro ou fora do mar, que me fez fascinado pelo seu trabalho”, acrescenta Silvio Tendler, que escalou Odir Almeida para a sua série documental “Caçadores da Alma” com grandes nomes da fotografia contemporânea brasileira.

Para o poeta Guilherme Zarvos, Odir Almeida carrega  uma disposição explosiva, mas também de saúde, de horas e horas dentro da água. “É entrando nesse mar, que também lembra petróleo, que ele produz beleza e também denúncia. É de lá que o Celacanto se faz presente e,  pelas perspectivas nada otimistas, será realidade”.

Segundo a curadora Maria Arlete Gonçalves, “para além do mistério, potência e beleza do mar à dentro, em diálogo pulsante e mutante com a cidade e seus habitantes, Celacanto é também uma metáfora dos atuais tempos líquidos, como define o pensador contemporâneo Zygmunt Bauman a era de transição da humanidade”, marcada por alterações climáticas cruciais para o futuro da vida na Terra. “Vivemos um tempo de incertezas em que nada permanece no  mesmo lugar, assim como o processo, a mirada e a obra do artista, apresentada na exposição”, define a curadora.

Odir Almeida


De Julio Bressane, ele absorveu o olhar para o cinema de arte, e do mestre da fotografia Milan Alran, herdou a sensibilidade e a técnica. Odir Almeida iniciou sua carreira há 20 anos, desde que começou a  registrar, documentar e produzir imagens para diferentes instituições como o Arquivo Nacional, Secretaria de Educação e Santa Casa da Misericórdia, ao mesmo tempo em que foi se tornando um dos mais solicitados fotógrafos do Rio de Janeiro para exposições, livros, catálogos e revistas especializadas em artes visuais. Foi assim, com a cobertura  fotográfica do que mais significativo se produziu em mostras e processos criativos da cena  carioca, que Odir  construiu um acervo único, que o levou a criar, em 2002,  o “Sóartecontemporanea”,  considerado o maior site de imagens de eventos artísticos visuais do Rio – com mais de 100 mil cliques e cerca de 15 mil fotos, disponibilizadas na web para todos os públicos.

Paralelamente ao trabalho como fotógrafo profissional, Odir Almeida foi experimentando novas linguagens e olhares e construindo uma obra autoral potente e singular, de circulação restrita a colecionadores, e que só em 2016 começou a ser descoberta a partir três mostras-ensaios sucessivas, com imagens produzidas de dentro do mar:  “Rio Noir”, apresentada durante as Olimpíadas na Escola de Cinema Darcy Ribeiro , “Rio que Mora no Mar”, durante o Festival Internacional Intercâmbio de Linguagens, e a Feira de Arte do Rio – Artigo. Atualmente, além da exposição Celacanto, Odir se prepara para mostrar outras faces de sua obra, na exposição “Tambor de Vidro Líquido”, na Galeria Artur Fidalgo, no Rio de Janeiro, com abertura prevista para 11 de julho. 

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