A hora e a vez das formigas


Carlos Motta

A humanidade não deu certo. 

Prova disso é o desejo, cada vez mais forte, de o homem exterminar os seus semelhantes, os de sua própria espécie.

O caso do atirador americano que matou dezenas de pessoas que assistiam a um show de música em Las Vegas é o exemplo mais recente dessa insanidade.

Ele não é, como muitos podem supor, um caso isolado de um surto psicótico, de uma patologia individual.

Segue, isso sim, uma lógica de doutrinação ideológica que vem sendo aplicada há décadas em praticamente todo o mundo.


Segundo esses preceitos, todos os diferentes, todos os que fazem parte de alguma minoria, todos os que professam crenças religiosas diversas das predominantes em determinada cultura, todos os que ousam exercer a liberdade artística, e mesmo os que lutam politicamente por uma sociedade mais igualitária - os chamados esquerdistas - são inimigos que devem ser eliminados. 

A cada pequeno passo em busca de uma sociedade mais fraterna seguem-se muitos outros de retrocesso.

Estão aí, como exemplos, a destruição, por parte de um governo formado por um quadrilha, do Estado de bem-estar social que os trabalhistas quiseram criar no Brasil, e a supressão das medidas que pretendiam tornar a capital paulista uma metrópole mais humana.

Os movimentos neofascistas ganham espaço a cada dia no Brasil.

E não só atacam impunemente tudo o que lembra a civilização, como têm apoio de parte do Judiciário.

O político que mais simboliza tal extremismo, aquele que pretende armar os seus seguidores e fala candidamente em liquidar fisicamente seus adversários, tem, segundo pesquisas eleitorais, de 15% a 25% das intenções de voto para a presidência da república.

Jovens, na maioria negros, pobres e moradores nas periferias das grandes cidades, são vítimas diárias da violência policial.

Os desmandos por parte das "autoridades" se multiplicam, arrasando reputações e vidas, como na vigência de um Estado ditatorial.

No mundo todo a brutalidade toma lugar da razão.

Atentados terroristas se tornam rotina. 

Aos homens bombas sucedem-se atropelamentos de multidões, esfaqueamentos, fuzilamentos - a criatividade humana para tais atrocidades é pródiga.

Analistas dão destaque ao avanço das forças da ultradireita no planeta, mas não tocam no essencial, o fato de que isso só foi possível porque nada foi feito para conter o seu crescimento.

A luta geopolítica destrói países inteiros, com a complacência de organismos internacionais criados para evitar que isso acontecesse.

Muito tempo atrás dizia-se que se o Brasil não acabasse com a saúva, a saúva iria acabar com o Brasil.

Do jeito que as coisas andam, talvez seja melhor deixar que as formigas tomem conta não só do Brasil, mas de toda a Terra.

Comentários