A convocação foi geral: todos os jornalistas deveriam comparecer ao auditório no dia tal, às tantas horas.
Ordem do diretor de redação, o Abominável.
Peões obedientes, fomos.
O auditório estava lotado, no mínimo umas 300 pessoas.
Esperamos alguns minutos e, finalmente, ele chegou.
Com aquela sua voz lenta e pastosa começou a falar.
Primeiro, os agradecimentos de praxe, "obrigado por vocês terem vindo e blá-blá-blá".
Em seguida, os autoelogios, uma minibiografia profissional na qual destacava o período em que morou nos Estados Unidos, seus anos de serviço ao Banco Mundial, o "risco de vida" que correu ao acompanhar as tropas americanas na invasão da minúscula ilha de Granada, e mais blá-blá-blá.
Depois, para surpresa geral, enumerou as vantagens de um profissional mudar de emprego.
Trememos.
E pensamos: será que vem mais um passaralho [apelido carinhoso que os jornalistas dão às demissões] por aí?
Mas na sequência de sua já longa e entediante alocução, o Abominável finalmente chegou ao ponto que o interessava:
- Por fim quero desmentir esse boato que está correndo na redação de que vou trazer para trabalhar no Estadão a ... , minha namorada, que está na Gazeta Mercantil. É mentira.
Dito isso, deu por encerrado o seu show.
Voltamos ao trabalho, os dias se passaram na rotina habitual, até que aquilo que era apenas um boato se confirmou: a namorada havia sido contratada para trabalhar como repórter especial, um dos cargos mais cobiçados no Estadão daquela época.
Para nós ficou uma lição: nunca acredite na palavra de quem não tem palavra.
(Carlos Motta)
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