Itiberê, 50 anos na estrada da música universal


Carlos Motta

Cinquenta anos atrás, Itiberê Zwarg começou a tocar violão e depois contrabaixo no “Xango 3” em São Paulo , onde nasceu. Desde 1977 toca no grupo de Hermeto Pascoal. A banda do "Campeão", como o genial multi-instrumentista alagoano é conhecido pelos amigos, mudou de formação várias vezes. Itiberê, porém, continua nela até hoje, ao mesmo tempo que desenvolve seu trabalho de compositor, arranjado e professor.

Como  líder da “Itiberê Orquestra Família” (de 2000 até 2009), gravou os CDs “Pedra do Espia” “Calendário do Som” e “Contrastes” formada por alunos das oficinas de música que ministra pelo Brasil afora - uma prova de sua coerência artística.

Atualmente lidera o septeto “Itiberê Zwarg & Grupo” tendo gravado o CD “Identidade”, e o DVD “Na tela Da Imaginação”. Em fevereiro de 2018, será gravado um novo CD . 

Itiberê faz a música que gosta, essa que foi batizada por Hermeto de "música universal", que é, como explica o baixista, nada mais, nada menos, que "a síntese de todas as manifestações musicais que existem".

E se essa música não toca tanto no rádio o quanto deveria, pela sua qualidade, ela tem sido capaz de, segundo Itiberê, "lotar nossos concertos" e fazer com que as pessoas saiam deles "flutuando numa atmosfera de viagem que não precisa de estímulo de droga nenhuma". 

O mais recente exemplo disso que Itiberê fala é o seu novo CD, “Universal Music Orchestra - Itiberê Zwarg & UMO Feat Hermeto Paschoal”, lançado pelo selo Biscoito Fino e disponível em lojas físicas e plataformas digitais. 

O disco, “Universal Music Orchestra - Itiberê Zwarg & UMO Feat Hermeto Pascoal”,  que comemora os 50 anos de carreira do músico, é um registro de um projeto especial em 2015, com a “UMO Jazz Big Band”, uma das mais importantes da Finlândia. Itiberê ficou dez dias na capital do país, Helsinque, convivendo com os músicos de lá. O resultado é esse novo trabalho, com 13 músicas, 12 suas - a exceção é o clássico "Autumm Leaves" -,  gravadas em apenas três dias, com a participação especial de Hermeto.

"Nem bem foi lançado nas plataformas digitais, recebi muitos elogios, curtidas e compartilhamentos", diz Itiberê na entrevista que deu ao blog. "Está sendo a vitrine que eu precisava para mostrar meu trabalho no formato big band, com a linguagem  universal."

"Eu sou muito otimista e tenho certeza de que apesar de convivermos com essa estrutura comercial, que com suas garras tenta dominar tudo, mais ou menos como os traficantes fazem com as pessoas, a música se impõe sobre todas as dificuldades, porque o público, que é nossa razão de existir, cada vez mais quer separar o que é do que não é arte verdadeira", diz Itiberê.

Que assim seja. 

Com a palavra, Itiberê:

Segundo Clichê - Como você vê o cenário da música popular instrumental no Brasil?

Itiberê Zwarg  - Primeiramente, acho que tenho que falar que o termo “popular instrumental” não retrata o que acontece na nossa cultura musical, e explico por quê: no século XX, a música no mundo evoluiu muito sob o ponto de vista harmônico, rítmico, melódico e técnico, num nível que não fica atrás daquela que é chamada “música erudita”, e algumas das vezes a suplantou nos quatro quesitos citados. Acho que temos que acabar com essas divisões, como se fossem os  partidos políticos de hoje, ou seja se você é de um, não pode trafegar pelo outro e vice-versa. Daí surge o campeoníssimo Hermeto Pascoal com sua genialidade e nos apresenta a “música universal”, que é a síntese de todas as manifestações musicais que existem. Agora, isso tudo não tem nada a ver com a música que é veiculada nas rádios, televisões etc. Essa reage aos estímulos da grana que os produtores querem ganhar, e muito poucos trabalhos desses podemos chamar de arte, pois visam tão e somente a grana fácil. Por outro lado, te digo que nossos concertos estão sempre lotados e as pessoas costumam sair deles flutuando numa atmosfera de viagem que não precisa de estímulo de droga nenhuma. O Brasil é um celeiro de grandes talentos, e nesse sentido o cenário da música aqui no Brasil está muito bem. Também existem alguns bons produtores, que fazem o público ter a oportunidade de assistir (e nós de tocar) a grandes concertos, como por exemplo o SESC, Sesi, festivais de jazz e alguns clubes de jazz, onde se pode apresentar trabalhos de qualidade. 
Eu sou muito otimista e tenho certeza de que apesar de convivermos com essa estrutura comercial, que com suas garras tenta dominar tudo, mais ou menos como os traficantes fazem com as pessoas, a música se impõe sobre todas as dificuldades, porque o público, que é nossa razão de existir, cada vez mais quer separar o que é do que não é arte verdadeira. Sempre existirão os incautos e ainda não conectados que a gente com paciência e carinho vai catequizando com o som. Viva a música universal!

Segundo Clichê - O que seria preciso para que a música instrumental alcançasse um público maior?

Itiberê - Que mais irmãos em som acreditem que só a nossa resiliência em fazer arte poderá desenvolver esse nicho cultural que orgulha a todos nós brasileiros, por sua excelência, e que é aplaudida em todo o mundo.

Segundo Clichê - Por que, na sua opinião, em muitos casos, a música brasileira é mais apreciada no exterior do que no seu próprio país?
Itiberê - Ainda por culpa desse mercado cruel para com a arte e para com o público. Em tudo o mundo existe esse mercado, mas como eu tive a oportunidade de estar em vários países mundo afora, pude constatar que aqui ele é muito cruel -  com raras exceções.

Segundo Clichê - Como tem sido o trabalho com as suas oficinas?

Itiberê - As “Oficinas da Música Universal” são uma das alegrias que tenho, pois elas são a base de tudo o que fiz e faço. Em 1999 comecei a fazê-las, primeiro na escola Villa Lobos, depois na Pro-Arte Maracatu Brasil e agora na Escola de Música da Praia de Botafogo - EMPB, e de forma itinerante, por todo o mundo, como  Nova York, Paris, Bogotá, duas vezes, Santa fé, na Argentina, Buenos Aires, Punta Ballena, no Uruguai, Tóquio, e por todo o Brasil. Tenho podido direcionar muitos jovens talentos que dignificam nossa arte musical. Eu tenho uma "máxima" que é: “Eu não formo ninguém para o mercado de trabalho, eu os tiro de lá.” Atualmente, tenho feito inovações que são muito boas: trata-se de fazer um trabalho - composição, arranjo, que componho ao vivo na presença dos alunos, que assim vivenciam o processo de criação -, e depois de tocado e amadurecido, entramos no estúdio e gravamos o que foi produzido. O resultado é espetacular, com todos tendo a oportunidade de olhar o que ficou bonito e o que não ficou bom, também, e onde se pode melhorar, assim fazendo uma  bem-vinda autocrítica, que sempre será a mola do desenvolvimento.

Segundo Clichê - Fale um pouco sobre como foi a sua agenda neste ano, os projetos futuros, sobre o seu novo disco.
Itiberê - Este ano tem sido um ano de ricas colheitas do que foi plantado já há muito tempo e estou muito feliz com isso. Dentre o que aconteceu, destaco minha viagem ao Japão com o Hermeto Pascoal & Grupo, onde fizemos quatro lindos concertos e onde tive a oportunidade de fazer cinco oficinas, sendo uma delas com crianças, que foi um lindo aprendizado para mim. Consegui fazer uma interação muito rica com as crianças tocando livremente, assim como estamos acostumados a ver as crianças rabiscando desenhos no papel. Elas tiravam sons dos instrumentos que tinham disponíveis. Ao final respondi a algumas perguntas das mães e uma em especial foi marcante. A mãe me perguntou: "Será que minha filha tem que ter aulas regulares em escolas aos cinco anos?" No que lhe respondi que não, pois nessa idade a música tem que ser lúdica e sem cobranças de resultados, somente o brincar com os sons. Ela me agradeceu aliviada, e eu entendi que na cultura deles isso é comum. Começa-se muito cedo a aprender a técnica e outras coisas. Logo chegando de volta ao Brasil, gravamos o CD “No Mundo Dos Sons”, com o  Hermeto Pascoal & Grupo, pelo selo SESC, que está sendo uma linda realização. O Ajurinã Zwarg, que está presente desde a primeira oficina, que se tornou a Itiberê Orquestra Família em 1999, fez também nesse CD sua estréia como baterista e saxofonista. Neste ano meu grupo ganhou um novo integrante, que é o jovem e talentoso Raphael Santos, de 18 anos, que toca violão, piano, sax tenor e flauta, e que irá estrear em CD no próximo trabalho que faremos, em fevereiro de 2018, pelo selo SESC. No momento preparamos o repertório com carinho e alegria. Este ano recebi proposta do produtor Joe Jotle, de Londres, que já foi aceita, de relançar o primeiro CD da Itiberê Orquestra Família, “Pedra do Espia” em dois formatos, CD e LP. O Ruy Pereira está fazendo a capa e logo mais estará sendo lançado. Também neste ano minha filha Mariana Zwarg, que já toca comigo desde o CD “Calendário do Som”, da Orquestra Família, teve um lindo convite para atuar com um sexteto em alguns festivais europeus, onde homenageou os 80 anos de seu padrinho, Hermeto Pascoal, com um supersucesso, tanto que foi convidada a voltar no próximo verão. Isso com meus filhos é para mim uma das alegrias da vida, ou seja: papai do céu me deu essa responsabilidade não só como pai, mas como quem produz oportunidades de desenvolvimento musical. Agora tenho que falar do CD “Universal Music Orchestra - Itiberê Zwarg & UMO Feat Hermeto Paschoal”, que fecha o ano das minhas colheitas. Foram dias memoráveis os que passei em Helsinque, na Finlândia, ensaiando, me apresentando no festival, e em seguida gravando em apenas três dias todo o repertório, com a participação do mestre Hermeto, da minha filha tocando flauta piccolo. Está sendo a vitrine que eu precisava para mostrar meu trabalho com essa linguagem de forma universal, contando com o leve sotaque de quem está acostumado a tocar jazz, mas podendo levar uma infinidade de matizes que eles nunca imaginaram tocar. O resultado foi excelente. Esse trabalho foi mixado em Amsterdã pelo Paul Pouwer e por mim. Está sendo lançado pela gravadora Biscoito Fino, que abraçou o projeto. Tenho recebido depois lançamento virtual pelas plataformas digitais inúmeros elogios ao trabalho, o que me deixa muito feliz. Quanto ao futuro, primeiramente tenho que plantá-lo para depois colher o que foi trabalhado. Parte grande de tudo o que tenho recebido se volta para o plantio, no dia a dia dos ensaios, composições e arranjos, com meu septeto e minhas oficinas.

Segundo Clichê - E a internet, ajuda ou não a difusão do trabalho do músico?
Itiberê - Sim, ela ajuda e muito. Na internet, todos têm oportunidades de se colocar, o que a torna um veículo de comunicação verdadeiramente democrático, mas é claro que iremos ouvir de tudo. À medida em que as pessoas aprendem a peneirar suas escolhas do que ouvir, poderão ter o que mais gostam sempre, e a qualidade artística vai sobrar.

Antes da internet, a maioria das gravadoras produzia e dava atenção ao que lhes daria resultados imediatos, e um músico “alternativo”, se é que podemos chamar assim, não era cotado por não oferecer perfil de sucesso imediato, e então era muito mais difícil se colocar naquele contexto. Agora, poucos dias depois do lançamento do “Universal Music Orchestra - Itiberê Zwarg & UMO Feat Hermeto Pascoal”, recebi 500 curtidas e não sei quantos compartilhamentos nas mídias sociais. Através delas meu trabalho está chegando para todos em todos os lugares do planeta, e isso é bom, não é? Também por causa da rapidez que os e-mails correm, podemos agendar com antecedência e segurança os futuros concertos. Os e-mails servem como documento válido.

Ouça o novo disco de Itiberê Zwarg:

iTunes: http://apple.co/2jpDwfm

Spotify: http://spoti.fi/2zEFLS2

Apple Music: http://apple.co/2zHa22J

Deezer: http://bit.ly/2AHTnJr

Google Play: https://goo.gl/VD48oz


Napster: http://bit.ly/2zHnDqN

Comentários