O rosto destes tempos de ódio


Tanto fizeram, tanto encheram a cabeça dos brasileiros de idiotices, criando um monstro vermelho culpado por todos os males do mundo, que o que antes parecia impossível cada vez mais surge como uma apavorante realidade - um Brasil governado por um fascista declarado, misto de general de opereta e Bonaparte de hospício, o notório deputado Bolsonaro.

Há pouco a falar sobre o que o ídolo dos bombados, viúvas da ditadura, lutadores de MMA e descerebrados em geral, pensa sobre questões políticas ou morais - a cada entrevista que dá, a cada discurso que faz, ele vomita suas frases de ódio e preconceito contra tudo o que tangencia os valores civilizatórios responsáveis pelo progresso da humanidade.


Pouco, porém, se sabe de sua plataforma econômica, sobre o que o deputado pensa - se ele de fato tiver essa capacidade - a respeito de questões prioritárias da vida nacional, a começar sobre a mais vital, neste trágico momento, que é como sair do buraco que os golpistas cavaram e no qual foram jogados 15 milhões de desempregados, milhares de empresas, e todos os sonhos de construção de uma nação menos desigual e mais democrática.

Os militares, tão cultuados pelo deputado fanfarrão, tiveram duas décadas para fazer deste gigante bobo um país respeitado pelos do Primeiro Mundo, mas falharam miseravelmente. 

Ele tiveram duas décadas e todo o poder em suas mãos: o único desejo dos generais-ditadores contrariado foi a convocação do goleador Dadá Maravilha, naquele tempo ainda chamado de Dario, para a seleção que disputaria a Copa do México, em 1970, quando ela ainda era dirigida pelo saudoso João Sem Medo, o João Saldanha de tantas histórias:

- O presidente [general Emilio Garrastazu Médici] escolhe quem quiser para o seu ministério, mas a seleção quem escala sou eu - disse o treinador, encerrando a questão.

Sem nada a acrescentar sobre os temas que realmente importam para o futuro do país, o deputado verde-oliva vai ocupando o seu espaço eleitoral, no vácuo de algum outro candidato de direita capaz de encarnar a tão cultivada repulsa às esquerdas em geral, promovida pelo establishment como peça fundamental da operação para consolidar o poder político, social e econômico.

Bolsonaro, por si só, é um personagem grotesco, que numa democracia de verdade estaria relegado à galeria dos bufões da política, ao lado de um Tiririca ou de um Romário.

Neste Brasil Novo, protagonizado por figuras igualmente bizarras, ele se destaca e atrai parte considerável do eleitorado, a massa deformada por anos de propaganda ideológica emburrecedora.

Não há como negar que o fascismo já se incrustou em boa parte da sociedade brasileira, e que o deputado boquirroto é quem o representa de forma mais inequívoca.

Para quem é saudoso do tempo em que a arte e a informação eram censuradas sem dó nem piedade, cidadãos eram presos, torturados e mortos porque pensavam de modo diferente das autoridades, as classes sociais se mantinham rigidamente estabelecidas, os conceitos de moralidade eram determinados por meia dúzia de seres iluminados, e a liberdade, em geral, era apenas um conceito abstrato, ou para quem ouviu dizer que esse foi um tempo de "ordem e progresso", o deputado-coturno é um prato cheio.

Os glutões certamente vão se lambuzar. (Carlos Motta)

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