O encerramento da Olimpíada do Rio, na noite de domingo, 21 de agosto, coincidiu com a apresentação do multi-instrumentista, compositor, arranjador e maestro Egberto Gismonti na 10ª edição do Festival Etapa de Música de Arte, em Valinhos, cidade de cerca de 110 mil habitantes localizada ao lado da superpopulosa Campinas.
A plateia que lotou o grande e bem cuidado auditório do Colégio Etapa não cantou música nenhuma, nem gritou "fora, Temer", muito menos ouviu do artista o tradicional oba-oba de tantos outros que anseiam ganhar as graças do público dizendo que estão muito contentes em se apresentar em tal ou qual cidade.
Gismonti, em vez disso, mal entrou no palco e já foi contando uma história, logo depois de ser saudado por aplausos misturados a entusiasmados "uô, uô, uô" exclamados por fãs mais barulhentos:
- O "uô, uô, uô de agora me lembra de certa vez em que me apresentei no Circo Voador, no Rio, muitos anos atrás, com minha mãe e uma tia minha na plateia. Naquele tempo eu havia resolvido que não tocaria mais nas minhas apresentações uma de minhas músicas, "Palhaço". Mas não deu outra, terminado o show, a plateia começou a gritar "palhaço, palhaço", e foi aí que minha mãe saiu de seu lugar, pegou o microfone para dizer "que plateia mais mal educada" - e ir embora em seguida.
Gismonti ainda informou que há um mês e meio havia se apresentado em um teatro lotado em Xangai - "1.500 pessoas, todas parecidas, que não entenderam nada da história que contei de um tio meu lá de Carmo [sua cidade natal, no Estado do Rio de Janeiro], mas me aplaudiram intensamente quando terminei de falar" -, contou de sua experiência com os índios Yawailapiti, no Alto Xingu, com os quais viveu um mês, e apresentou ao público a pianista Sonia Rubinsky, presente na plateia, na suas palavras, "hoje, a maior intérprete da obra de Villa-Lobos".
O resto foi música e encantamento, criatividade e perfeição técnica de execução que foge a qualquer classificação que se queira dar, acima dos rótulos, e um universo além da mediocridade que nos impõe a chamada "indústria cultural".
Uma apresentação como essa nos nos faz pensar como é possível que gigantes como Gismonti e tantos outros nas mais diversas áreas de atividade - os atletas que ganharam as 19 medalhas na Olimpíada do Rio, por exemplo -, possam brotar em um país cujo Estado, com brevíssimas interrupções, nunca fez o menor, o mais ínfimo esforço, para revelar, incentivar e apoiar esses talentos natos.
A gente sai de um espetáculo desses e fica pensando: como é que o Brasil pôde dar ao mundo gênios musicais da dimensão de Egberto Gismonti, Hermeto Pascoal, Tom Jobim, Pixinguinha, João Gilberto, Heitor Villa-Lobos, Radamés Gnattali, Baden Powell, Raphael Rabello, Naná Vasconcelos, só para citar alguns poucos que alcançaram a dimensão global?
A gente fica pensando...
A gente fica pensando em como um país que teve mediocridades absolutas em seu governo máximo, e hoje se supera com esse anão moral, intelectual e ético chamado Michel Temer na chefia do Executivo, cercado por um bando dos mais repulsivos seres que já habitaram a política nacional, é capaz de produzir tanta coisa boa, de ter sido solo de onde brotaram tantas pessoas que engrandecem a humanidade.
Mistérios, mistérios...
(Carlos Motta)
Sou contra violência. Mas advertência progressiva até que ia bem no caso do golpista. Primeiro uma bolinha de papel na cabeça. Depois uma bola de gude. Depois uma bigorna, e depois um piano. Quem sabe assim não percebe que o Povo Brasileiro,não gostou nada da sacanagem que ele fez!
ResponderExcluirMês passado, em Tiradentes, vi uma Congada, tradição criada pelos escravos de que corpo e alma este Brasil também se formou. Tão lindo, tão Brasil que me emocionei - e até parei de me preocupar tanto com Temer & caterva. Eles passam. O Brasil é outro. Pode demorar, mas eu confio.
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